segunda-feira, 24 de agosto de 2009

A Imprensa: Fonte e Objeto da História

Estava refletindo sobre minhas fontes de pesquisa: os jornais, a imprensa escrita. Estou às voltas com o jornal Folha do Povo, Folha da Manhã, Diário de Pernambuco e Jornal Pequeno, todos do Recife, assim como revistas da época (décadas de 40 e 50).
Para o historiador que se dedica aos tempos modernos e pós-modernos é difícil não recorrer ao material escrito produzido pela imprensa. Por muito tempo, essa fonte foi tratada como um documento de pouco valor histórico por não corresponder às exigências, aos critérios científicos positivistas, que o legitimasse como prova histórica do acontecido, do passado. Não existia, e não há, neutralidade ou imparcialidade em matérias e notícias jornalísticas; e ontem, mais do que hoje, o posicionamento político-ideológico era explícito, os jornais eram partidários; se oferecem a um público leitor definido; sabem muito bem a favor de que e de quem estão; é certo que também a oportunidade faz a hora, e tem aqueles que sabem mudar de rumo na hora certa.
Quando recorremos a imprensa como documento histórico ela não se representa apenas como fonte de informação sobre a época estudada, mas também representação do pensamento, da opinião, da atitude de um tempo que passou ou que passa. Cuidados metodológicos devem ser acionados para não se deixar seduzir pelo o que conduz o suporte - porque o jornal é um suporte, um veículo de histórias, idéias, representações; não devemos naturalizar a informação do acontecido; na confecção e elaboração do jornal há uma rede interessada em dar um sentido próprio ao que acontece, em formar opinião a respeito das coisas, influir, fazer refletir de maneira diferenciada de outros veículos de informação. Assim, o documento também é objeto de estudo.
Os jornais, a imprensa, são janelas. Algumas só abrem uma banda, outras tem o vidro embaçado, ou disfarçado, ou colorido, ou desfocado, ou sujo, e até quebrado; algumas se abrem generosas; umas permanecem fechadas por quererem assim, outras por estarem emperradas ou quebradas; estas se limitam a escutar e reproduzir o que se passa fora. No entanto, o que é vislumbrado, desvelado ou escutado por essas janelas depende da posição: janelas são olhos de uma casa, de um prédio, de um grande edifício. A variedade de funções dessas edificações é imensa. Nascentes ou poentes; discretas, ocultas ou panorâmicas. Essas janelas nos permitem ver, mas também podem obscurecer a visão.
Em tempo, acabei de ler artigo muito bom sobre o poder da mídia no blog História em Projetos; é de Luiz Carlos Azenha, o título é Aprenda a ler jornais e não seja enganado/a!
Estudem os golpes midiáticos. Eles virão em 2010?
É muito importante a leitura desse artigo; não há como falar do que passou sem se pensar no que é vivido hoje.

4 comentários:

Anônimo disse...

Muito obrigado por esse post, eu estou pesquisando imprensa tbm e tava com essa idéia de ela ser fonte e objeto ao mesmo tempo. Você algum autor que defenda essa perspectiva pra mim me basear? Se souber me responder aqui pelos comentários mesmo; desde já agradeço!

texto sobre disse...

Fico feliz que o post tenha sido útil. No livro Fontes Históricas, org. por Carla Bassanezi Pinski, Editora Contexto, 2006 vc encontra artigo de Tania Regina de Luca, que trata das fontes impressas; e outro livro muito bom, tb da Contexto, é História da Imprensa no Brasil, de Ana Luiza Martins e Tania de Luca.Geralmente, quem trabalha com a linha teórica-metodológica da história cultural, cultura e memória, observa as fontes não apenas como o conteúdo de uma época, mas também como uma forma de dizer, de representar. Um historiador excelente, nesse sentido, é Durval Muniz de Albuquerque Júnior, recomendo a leitura do seu livro História. A arte de inventar o passado.Edusc, 2007.

Anônimo disse...

Muito obrigado, ajudou bastante!

Anônimo disse...

Olá Zélia, estou terminando minha monografia, e cito o seu blog:


Por este trabalho propor descrever como a grande imprensa noticiou o processo de desestatização da RFFSA, se torna necessário compreender como a utilização da imprensa como fonte histórica, e sua importância como objeto historiográfico, notoriamente toda a sociedade já reconhece desde outros tempos a importância da imprensa, no entanto, a historiografia foi quem mais demorou a perceber tal importância e reconhecer este meio de produção como representativo de uma sociedade e de uma época, a historiadora Zélia Gominho em seu Blog, no dia 24 de Agosto de 2009, publica o artigo “A Imprensa: Fonte e Objeto da História ”, onde discute de forma clara e simples a importância da imprensa como fonte histórica.

Por muito tempo, essa fonte foi tratada como um documento de pouco valor histórico por não corresponder às exigências, aos critérios científicos positivistas, que o legitimasse como prova histórica do acontecido, do passado. Não existia, e não há, neutralidade ou imparcialidade em matérias e notícias jornalísticas; e ontem, mais do que hoje, o posicionamento político-ideológico era explícito, os jornais eram partidários; se oferecem a um público leitor definido; sabem muito bem a favor de que e de quem estão; é certo que também a oportunidade faz a hora, e tem aqueles que sabem mudar de rumo na hora certa.

O uso da imprensa, portanto, se encaixa em uma concepção pós Annales, em que a retratação documental se abrange a outras áreas, porém, não apenas utilizar os documentos como representativos do período, devemos nós como profissionais e pesquisadores do campo historiográfico, reconhecer os interesses em jogo, as ideologias próprias dos jornais em cada época, antagonismos e disputas sociais, continuando :
Quando recorremos à imprensa como documento histórico ela não se representa apenas como fonte de informação sobre a época estudada, mas também representação do pensamento, da opinião, da atitude de um tempo que passou ou que passa. Cuidados metodológicos devem ser acionados para não se deixar seduzir pelo o que conduz o suporte - porque o jornal é um suporte, um veículo de histórias, ideias, representações; não devemos naturalizar a informação do acontecido; na confecção e elaboração do jornal há uma rede interessada em dar um sentido próprio ao que acontece, em formar opinião a respeito das coisas, influir, fazer refletir de maneira diferenciada de outros veículos de informação. Assim, o documento também é objeto de estudo. (grifo meu)”.

Interessante perceber que a própria fonte histórica neste caso, se torna também objeto de estudo, para compreender como aconteceu a privatização da RFFSA através de um olhar sobre os jornais do período, problematizando o que foi dito, como foi dito, porque foi dito, as rupturas e as continuidades.

Disponível em: http://gominhosdehistoria.blogspot.com/2009/08/imprensa-fonte-e-objeto-da-historia.html, Acesso em Janeiro de 2010.